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A Guerra | EP24 | Spínola e Senghor


Fragoso Alas era agente da PIDE. Possuía um talento invulgar para a espionagem. Tinha estado dois anos na embaixada portuguesa de Kinshasa, sob a capa de adido comercial. Conhecia bem Mobutu e era ouvido por ele. Foi Fragoso quem conseguiu pôr Léopold Senghor, Presidente do Senegal, em contacto com o general Spínola.

Foi agendado um encontro no território República do Senegal. O tema da reunião era do conhecimento de Marcello Caetano. Tratava-se de estudar as hipóteses de estabelecer conversações tendo em vista alcançar uma solução negociada para o problema da Guiné-Bissau.

A reunião teve lugar a 18 de Maio de 1972. A equipa de que o comandante-em-chefe e governador-geral da Guiné se fez acompanhar na sua deslocação a um complexo turístico de Casamance (Clube Mediterranée), situado próximo da fronteira, era pequena. Constituíam-na Carlos Fabião, Fragoso Alas e o capitão Nunes Barata.

A segurança imediata incluía dois helicópteros. Os jatos da Força Aérea Portuguesa sobrevoavam o lugar e um batalhão de paraquedistas estava de prevenção. As circunstâncias eram inéditas e havia de ter em conta a possibilidade de traição, quer da parte do PAIGC, que sabia do que se passava, quer do lado das forças senegalesas.

Entraram na sala de reuniões o general Spínola, o capitão Nunes Barata e Fragoso Alas. Carlos Fabião permaneceu junto aos helicópteros. Era o responsável pela segurança do general. Cabia-lhe a responsabilidade de comandar o ataque, se as coisas corressem mal. O plano de emergência consistia em bombardear de imediato a zona e fazer depois avançar os paraquedistas para liquidarem qualquer possível resistência e recolherem os vivos e os corpos dos nossos mortos.

Léopold Senghor fez jogo limpo. Verificou-se a coincidência de muitos pontos de vista do presidente da República do Senegal e do comandante das forças portuguesas na Guiné e foi possível traçar um plano de atuação, a submeter ao governo de Lisboa e aos movimentos independentistas. Projectava-se declarar, assim que possível, o cessar-fogo e organizar uma conferência sem condições prévias. Os representantes do governo português negociariam diretamente com os movimentos de libertação da Guiné-Bissau: o PAIGC e a FLING. A inclusão deste movimento, com pouca expressão no terreno, denunciava a vontade de Senghor continuar a proteger os interesses do Senegal no quadro duma futura independência. Tratava-se de um projeto a médio prazo. Durante um período de dez anos, enquanto se preparavam os quadros necessários para garantir a administração, o poder, na Guiné e em Cabo Verde, seria entregue a uma administração mista, constituída por elementos nomeados pelos movimentos independentistas e pelo governo português. Seria então dada a palavra aos povos da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, que decidiriam os termos do seu relacionamento futuro com Portugal: independência total, federação de estados ou inclusão numa comunidade afro-luso-brasileira. Curiosamente, o projeto estava em conformidade com as ideias defendidas por Caetano anos atrás. Por outro lado, dificilmente teria sido formulado sem o consentimento tácito de Amílcar Cabral, um homem que o destino pusera à frente de um movimento armado mas a quem o feitio predispunha às negociações.

Era a solução política que Spínola perseguia.

Ficou marcado um segundo encontro.

António de Spínola deslocou-se a Lisboa e expôs ao primeiro-ministro português os resultados da reunião. Caetano tivera tempo para refletir e para tomar o pulso ao equilíbrio de forças em que assentava o poder. Considerava que, no quadro global da guerra em três territórios, a derrota militar na Guiné era preferível à negociações. O governo central não estava realmente disposto a modificar a sua política colonial, isto apesar do pretenso apoio e incentivo que deu a Spínola nas suas diligências, de que estava, obviamente, a par. Marcello Caetano exigiu o fim imediato dos contactos com Senghor. Portugal poderia ser vencido na Guiné, mas não negociaria.

Ao general Spínola não restava outra solução que não fosse a de continuar a guerra. Como achava que a continuação da política do governo português ia contra os interesses do país, começou a conspirar.

Fica por saber se o PAIGC, seguro do seu poder militar, com as forças armadas portuguesas na defensiva, iria aceitar uma moratória de dez anos para o seu projecto de independência. Provavelmente, não o faria. De qualquer modo seria preferível começar a negociar, numa altura em que a luta armada se encontrava em fase de relativo equilíbrio.

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