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OS TURRAS, SÓ SABIAM PLANTAR MINAS,EMBOSCADAS E ATAQUES DE MORTEIROS AOS AQUARTELAMENTOS.


Minas - O Maior Inimigo na Guerra do Ultramar Português

Autor: Miguel Ferreira

Introdução

O prestígio académico de uma instituição com o relevante papel na formação dos quadros superiores

Das forças armadas portuguesas como é o IESM e a consideração que nos merecem os promotores do

Núcleo Impulsionador das Conferências da Cooperativa Militar, além da nossa consciência, levam-nos

A manifestar a nossa leal discordância pelas alíneas das conclusões do Seminário “Guerra de

África – Portugal Militar em África 1961-1974 – Actividade Militar”, onde é afirmado que, e cita-se

De cor, mas julgando interpretar a ideia expressa, a situação nos três teatros estava controlada pelas

Forças armadas portuguesas e que era sustentável em termos militares, isto é, segundo as conclusões,

A situação de guerra não era crítica e podia ser mantida.

Estamos em completo desacordo com tal conclusão e consideramos que ela se insere num persistente

Movimento ideológico de revisionismo histórico que pretende adulterar e contrariar à posteriori os

Fatos e os acontecimentos. Este movimento teve expressão inicial logo a seguir ao final da guerra e

ao derrube do regime em 25 de abril de 1974 com o título de “Vitória Traída”, escrito por quatro

Generais que desempenharam funções de comando em teatros de operações de África.

A conclusão de que as foças armadas portuguesas controlava a situação nos teatros de operações

Em 1974, produzida sem base na realidade, mas repetida com insistência, tem um fio condutor

Ideológico que, partindo de uma convicção ganha empiricamente ou de uma intenção deliberada,

Quer induzir a ideia de que, estando a situação militar controlada em Angola, Guiné e Moçambique,

A guerra que sustentava a política ultramarina do antigo regime podia ser prosseguida, com a

Manutenção das colónias enquanto províncias ultramarinas de um Estado Português pluricontinental

E multirracial, do Minho a Timor. Sendo assim, não haveria justificação para a acção militar de

Derrube do dito regime em 25 de Abril de 1974, nem para as independências das colónias.

A defesa da política do regime de ditadura derrubado em 25 de Abril de 1974 feita posteriormente é

Legítima, resulta da democracia instaurada nessa data e aceitamo-la com toda a naturalidade. Não é

Pois o direito de defender o antigo regime e a sua política colonial que nos leva a contestar as

Conclusões, o que nos leva a contestar as conclusões é que contrariam a realidade e o que dessa

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Realidade está hoje disponível nos arquivos e outras fontes, incluindo as que resultam das acções de

Alguns dos mais importantes decisores da altura.

A tese de que as forças armadas portuguesas controlavam a situação nos três teatros de operações, ou

Até da vitória militar em parcelas do teatro, ou da possibilidade de manter a soberania sobre os

Territórios ultramarinos esbarram em dois obstáculos:

1) Não corresponde à verdade dos fatos – isto é, contraria o que foi escrito, afirmado e testemunhado

Na época;

2) Torna absurda e incoerente a actuação de todos os atores políticos e militares com

Responsabilidades na época, sejam os militares, sejam os políticos.

Isto é, se a afirmação fosse correta, a actuação de todos os atores políticos e militares durante os anos

De 1973 e 1974 teria sido absurda, desde o então presidente da República ao mais anónimo dos

Militares que conscientemente intervieram no 25 de Abril, do primeiro-ministro e dos membros do

Seu governo, à totalidade dos generais portugueses.

Que esta tese, além de colocar os responsáveis políticos e militares a representar papéis num teatro

Do absurdo, contrarie a doutrina militar geral e a doutrina militar de contra-subversão parece ser um

Pormenor adjacente, mas uma escola de formação superior em estudos militares não pode deixar de

Saber situar-se perante esse quadro.

Uma tentativa de estabelecimento de termos de referência

As conclusões de que a situação militar nos teatros se encontrava sob controlo contêm o conceito de

“Controlo da situação” e de “situação crítica”. Tomemos esses conceitos como ponto de partida para

Os precisar.

“Controlo da situação” quer dizer assegurar condições de vida em segurança na totalidade do

Território e ter capacidade para fazer face aos perigos correntes (atuais), contendo as ameaças dentro

De limites espaciais definidos (e nos limites previsíveis e prováveis num futuro temporal de médio

Prazo -5 anos), ou seja, ter capacidade para fazer face à ameaça esperada, garantindo a continuidade

De uma situação política. Em resumo, uma situação em que o sistema (neste caso político) continua a

Funcionar e pode cumprir a sua missão no seu raio de acção (tempo e espaço) sem ser previsível uma

Falência geral.

“Situação crítica” quer dizer estado de incapacidade para as forças armadas evitarem o agravamento

Da situação, de evitarem que zonas vitais sejam atingidas e que ponham em causa uma ordem

Estabelecida, que deixem de ter capacidade para acorrer e dominar dois focos de conflito no mesmo

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Teatro, e manter uma reserva para fazer face às possibilidades mais perigosas. Isto é, numa situação

Crítica zonas vitais estão em falência e o conjunto corre perigo, pelo que há necessidade de

Procedimentos de emergência.

Situação controlada – situação crítica

Apenas recorrendo a fatos demonstrativos e sem qualquer pretensão de sermos exaustivos, mas dado

Termos sido autores de duas obras onde reunimos a informação que conseguimos sobre esta época de

1961-1974 E sobre a guerra, referimos algumas situações nelas publicadas e que, julgamos,

Contrariam a tese do controlo militar dentro dos limites de acção e reacção das forças portuguesas.

São situações retiradas de relatórios da época e de afirmações feitas pelos responsáveis de então

(sendo certo que alguns disseram posteriormente coisas diferentes do que afirmaram e escreveram na

Altura) e que estão publicadas.

É um resumo longo, mas a quantidade de informação resulta do respeito que as instituições

Promotoras do Seminário nos merecem. Todas estas informações estão publicadas e estão

Disponíveis.

Assim:

Angola

Em Angola, a situação no Norte era de tal forma preocupante que em 19 de Fevereiro de 1974 o

General Luz Cunha, comandante-chefe, apresentou a ameaça de um ataque concreto da República do

Zaire a Cabinda na reunião do Conselho de Defesa Militar de Angola. Nesse dia, fez uma exposição

Sobre a possibilidade de um ataque de grande envergadura da República do Zaire a Cabinda e

Apresentou um relatório onde referiu explicitamente o problema particular de Cabinda, face às

Ameaças de acções de força por parte da República do Zaire, dizendo que “ultimamente têm-se

Acentuado o número de notícias que referem a possibilidade da FNLA executar uma acção de força

Contra aquele território (Cabinda) apoiada directa ou indirectamente pelas Forças Armadas do Zaire

E por outros países, nomeadamente a Líbia.

Esta possibilidade era conjugada com ataques na fronteira Norte e levou o general a, perante a ameaça

Descrita, enviar a 17 de Março, uma mensagem (Muito Secreto) para o ministro da Defesa (Silva Cunha)

Relatando a situação e informando as acções tomadas, que incluíam um forte apoio de meios aéreos da

África do Sul. A mensagem dizia o seguinte: “Em consequência da ameaça de acções de força contra

Cabinda e fronteiro norte foram programados e postos em execução um plano de reconhecimento fotográfico

(RecFoto) com meios aéreos da FAP (1ªfase) e sul-africanos (2ª fase) a fim de detectar indícios de

Preparativos de concentração de forças inimigas”.

Como as notícias processadas continuassem a referir o lançamento de uma grande ofensiva em data

Próxima, a África do Sul fez, no dia 20 de Abril, uma proposta de apoio ao Comando-Chefe em Angola.

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Esse apoio passava pela colocação em Luanda de dois aviões Canberra para missões de reconhecimento

Fotográfico e de seis aviões Mirage para execução de acções de demonstração de força. Estes aviões

Ficariam na Base Aérea 9 (Luanda) em vez do AB 3 (Negage), por ali existirem melhores condições de

Pista e logísticas e de ligação com o CCFAA. Os aviões manteriam as insígnias sul-africanas e o pessoal

Usaria o respectivo uniforme nacional. As autoridades sul-africanas propunham que a justificação da

Presença sul-africana (cover story) fosse a de ligação e treino de voo.

Pela parte portuguesa, seria reforçado o destacamento temporário da Força Aérea em Cabinda com dois

Aviões B-26, um Heli canhão e um DO-27, e o Sector com duas companhias de Comandos. Foram

Também dadas instruções para acções de bombardeamento além-fronteira, de posições de foguetões

122mm.

Estas missões estavam previstas para o período de 29 de Abril a 3 de Maio.

A situação no Norte de Angola estava pois muito longe de ser controlada pelas forças portuguesas, havia

Uma ameaça séria de intervenção externa com meios convencionais, que fazia com que as forças

Portuguesas necessitassem de apoio considerável e extraordinário da África do Sul. O comando chefe de

Angola considerava, em Fevereiro de 1974, as seguintes vulnerabilidades das forças portuguesas para

Fazerem face a um inimigo convencional, como o que ameaçava o norte de Angola:

- Limitado potencial de fogo das companhias e batalhões de caçadores, cuja organização estava adaptada

À guerra de contraguerrilha;

- Inadequada preparação das unidades para a guerra convencional;

- Muito deficiente capacidade de defesa anticarro (dado que a República do Zaire dispunha duma

Brigada blindada com 200 blindados);

- Carência geral de meios blindados;

- Carências muito graves no que respeita a material automóvel nas unidades de apoio de combate,

Especialmente de artilharia;

- Inexistência de meios de defesa aérea e antiaérea, reconhecendo que o Zaire e as nações limítrofes

Dispõem de superioridade aérea;

- Muito limitada capacidade de apoio aéreo;

- Deficiências em meios navais, especialmente em fragatas.

A questão da ameaça convencional sobre os teatros de operações de Angola e Moçambique devia ser

Tomada a sério, facto que já vinha acontecendo.

Assim, numa reunião realizada de 18 a 21 de Junho de 1973 em Pretória entre militares sul-africanos,

Portugueses e rodesianos, no âmbito de uma aliança militar efectiva, embora mantida

Secreta, ao fazer o balanço geral das actividades, o presidente da reunião, general W. R. Van der

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Riet, da África do Sul, salientou algumas informações importantes, particularmente no que se refere

A uma possível ameaça convencional contra os territórios Alcora (África do Sul, Rodésia, Angola e

Moçambique) por volta de 1976, pelo que tinha sido decidido discutir essa ameaça num ponto

Específico da agenda da reunião. Isto é, existia uma ameaça real de forças convencionais e as forças

Portuguesas não estavam preparadas para se lhe opor e controlar.

Quanto à Frente Leste

Também na Frente Leste a situação se caracterizava por estarem aldeados forçadamente cerca de

800.000 Do seu milhão de habitantes e estarem estacionados na zona 35.000 efectivos. Portanto, a

Ideia de “vitória militar” (um estranho conceito numa guerra, a não ser que sejam consideradas

Possíveis vitórias civis separadas, que seja possível uma vitória militar numa guerra subversiva, que

É essencialmente política e assim classificada em todos os manuais militares, incluindo o português,

Ou que se confundam batalhas e guerras), só pode aceitar-se se significar esse aldeamento forçado,

Isto é, a reunião em espaços confinados, de 80% da população, e o controlo do território, onde os

35.000 Efectivos actuariam, assim, numa zona quase inabitada e de fácil controle.

Os aliados portugueses na região, a África do Sul, com quem existia uma forte cooperação, tinham

Uma ideia não só muito contrária à da vitória militar no Leste, mas até quanto ao modo como as

Forças e as autoridades portuguesa ali estavam a actuar e que, segundo eles, ia no sentido contrário do

Que seria indicado para controlar a situação, isto é, as populações, como veremos.

O Leste foi nos anos finais da guerra e por pressão dos vizinhos e aliados sul-africanos, o principal

teatro de operações de Angola. Desde 1968 que na zona era desenvolvida uma intensa cooperação

Militar com a RAS, nomeadamente através dos CCAA (Centros Conjuntos de Apoio Aéreo), a que

Os sul-africanos deram o nome de código inicial de “Operação Bombaim”. Quer isto dizer que a

África do Sul investiu elevados recursos e meios no Leste e conhecia bem a situação militar e civil.

Embora as opiniões e apreciações sul-africanas devam ser “temperadas” pelos seus interesses

Estratégicos, não deixam de ser importantes e, mais ainda, quando merecem o acordo dos estados-maiores

Portugueses.

A partir de 1970 a situação no terreno, e ao contrário do que hoje é afirmado, motivava sérias

Preocupações dos nossos aliados e dos comandos portugueses. Em Março de 1970, numa reunião

Realizada em Pretória com militares portugueses do SGDN e do Comando-chefe de Angola, o

General Charles Fraser, chefe do estado-maior conjunto das forças de combate da África do Sul, fazia

A seguinte apreciação da situação no Leste: “tem havido uma deterioração rápida e contínua do

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Controlo militar e administrativo no Leste de Angola desde o início de 1968, isto é, na área do

Empenhamento directo da SADF na guerra de Portugal”1.

Os sul-africanos tinham uma noção integrada da ameaça ao poder branco em África – ao contrário

Dos defensores da tese da “vitória militar no Leste” – assim, afirmava o general Fraser, que a guerra

De Angola devia ser relacionada “com outras ‘guerras de libertação’ travadas a Norte da RAS”. Por

Isso, a guerra de Angola não podia ser vista isoladamente, em relação a outras lutas semelhantes que

Se travavam em Moçambique, na Rodésia, no Sudoeste Africano e no Capri vi. Ignorar este factor e a

Crescente cooperação entre os movimentos de libertação seria um grave risco para todos e

Significaria um aumento do perigo para a RAS e para os seus amigos, situação confirmada por um

Conjunto de factos ocorridos recentemente, entre os quais era de realçar a recente “Conferência

Realizada em Morogoro, Tanzânia, entre 25 de Abril e 1 de Maio de 1969, por iniciativa do

SAANC”, onde “foi tornada enfática a necessidade de fortalecer a aliança existente entre a ZAPU

(Rodésia) e a SAANC (RAS), pela inclusão da Frelimo (Moçambique), do MPLA (Angola), da

SWAPO (Sudoeste Africano e Capri vi) e do PAIGC (Guiné-Bissau), com a intenção de reunir os

Recursos de cada um e de criar uma frente de libertação sólida, na luta contra a dominação branca

Imperialista, na África Austral”2.

Embora a apreciação do general Fraser deva, como se disse, ser lida à luz do interesse da África do

Sul, ele afirma que: “É evidente que, no Leste de Angola, o MPLA tem consolidado a sua posição a

Um tal ponto que se pode esperar que esta área venha a prover bases sólidas e as necessárias para a

Expansão da guerra às regiões mais populosas e mais prósperas do Oeste e do Norte de Angola”.

Também se devia considerar, relativamente às actividades da UNITA, que num futuro próximo,

Houvesse um aumento do número das suas acções e mesmo a abertura de uma nova frente na Huíla,

O distrito imediatamente adjacente à Ovambolândia no Sudoeste Africano, e isso “é de especial

Significado para a RAS”.

O general Fraser, como comandante das forças conjuntas da África do Sul tinha três questões prévias

A apresentar à delegação portuguesa.

Em primeiro lugar, ele e o seu estado-maior tinham feito um estudo minucioso da situação no Sueste

De Angola. A conclusão era “perturbante”, pois, apesar do aumento de forças no distrito e do

Considerável número de voos da Força Aérea da África do Sul, em apoio das forças militares nessa

Área e mais a Norte, o inimigo continuavam a progredir para Oeste. E isso era uma situação

Inadmissível para a África do Sul, pois deseja evitar que “o inimigo estabeleça um santuário no Sul

1 Ver “1ª Parte. A situação militar na África Austral com referencia especial para a RAS”, de Março de 1970,

Em AHM/7B/44/Cx. 370/nº 01.

2 Ver Idem.

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De Angola, do qual possam ser montadas operações de subversão contra o Sudoeste Africano”. Daí

Que a diligência comum devia ser a de parar a penetração. Ou seja, como dizia, em conclusão, “nós

Devemos proteger-nos, a nós próprios, contra a subversão”. Mas para que não subsistissem dúvidas

Sobre a urgência de uma crescente cooperação na condução da campanha, o general Fraser

Acrescenta: “Há um medo entre os nossos povos negros, como de facto sabemos existir um medo

Entre os vossos, de que os terroristas estejam, lentos mas efectivamente, alcançando os seus objectivos

Imediatos de penetração param Oeste. Os nossos povos negros estão também acusando desânimo

Porque o esforço aéreo que nós estamos levando a cabo, que eles podem ver sem que ninguém lhes

Tenha dito nada acerca dele, não está a alcançar o que nós insistimos em dizer ser a nossa intenção,

Isto é, a derrota da SWAPO. Deverá ser nossa diligência conjunta parar essa penetração”3.

Em segundo lugar, afirmou o general Fraser, “gostaria de sugerir alguns melhoramentos à campanha

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